Sustentabilidade Ambiental: Brasil na contramão e em contrassenso
No dicionário Houaiss o termo acidente relaciona-se com os verbetes eventual, fortuito, inesperado, imprevisto. Por sua vez, o verbete desastre implica em acontecimento que causa sofrimento e grande prejuízo, infortúnio. Este último adequa-se sem ressalvas ao rompimento da barragem de fundão ocorrido em 5 de novembro de 2015 quando a lama de rejeitos percorreu mais de 650 km de rios e córregos, matando 19 pessoas e mais de 10 toneladas de peixes, desabrigando centenas de famílias, contaminando em 17 dias um bioma que só será recuperado pela natureza em mais de 100 anos. Os impactos foram e continuam sendo monitorados não sendo possível precisar a sua extensão. Ratifica-se então a total adequação dos termos sofrimento, prejuízo e infortúnio. Contudo, contesta-se a imprevisibilidade que poderia descrever tal evento como um mero acidente. Entre os anos de 2005 e 2010 foram registrados pela empresa 5 rompimentos, com e sem vazamento; a barragem operava acima da capacidade, com problemas de drenagem, falhas estruturais e sem plano de contingência. Tais elementos descaracterizam portanto o caráter de inesperabilidade ou eventualidade atribuídos aos acidentes. Opondo-se ao grito de socorro do meio ambiente, calado pela efusão de gols que dominava as atenções, foi firmado acordo com as empresas responsáveis em 25 de junho de 2018, suspendendo uma ação civil proposta pelo Ministério Público Federal (R$ 155 bi) e extinguindo outra ação promovida pela União e unidades Federativas de Minas Gerais e Espírito Santo (R$ 20 bi) num acordo que envolve estudos paralelos e possíveis renegociações futuras. Certamente um contrassenso.
Contudo a insensatez já apresentava sinais nas últimas décadas quando, na contramão das nações desenvolvidas e orientações de diversos organismos internacionais, o Brasil modificava sua matriz energética em sentido oposto a qualquer lógica ambiental. O país que festejava produção de energia limpa e renovável às custas de ampla modificação nos corpos hídricos devido à construção de grandes usinas, em face à crise hídrica e elevada demanda elétrica ampliou seus investimentos em fontes não renováveis. Segundo dados do Balanço Energético Nacional da Empresa de Pesquisa Energética (BEN/EPE), as fontes renováveis que já representaram quase 80% da produção de energia primária no país foram sendo gradativamente substituídas por alternativas não renováveis que chegaram a atingir o percentual de 59,2% em 2017. Contudo, tais argumentos não devem ser observados como justificativas para as recentes obras na Bacia Amazônica, visto que a despeito da alternativa tecnológica utilizada (geração à fio d’água) os impactos ambientais também já se fazem presentes.
Acelerando na contramão, a Lei 7.802 (1989) que regulamenta o uso de agrotóxicos no Brasil, também encontra-se em discussão. À princípio, deve-se alertar que o caráter restritivo atribuído à mesma é posto em questão quando observa-se o volumoso percentual de incentivos fiscais que são concedidos à indústria nacional de pesticidas, em percentuais superiores aos medicamentos. Não sendo tais privilégios suficientes, discute-se projeto do Lei que não apenas subtrai o termo pesticida, mas também permite o uso de substâncias ainda em fase de estudos pelos órgãos competentes, mesmo em caso de efeitos ainda desconhecidos. O jogo de palavras, abre espaço também para maior imposição dos interesses empresariais em detrimento da segurança alimentícia e da saúde humana e ambiental pois elimina barreiras e aproveita pequenas brechas legislativas.
Na contramão e em contrassenso o Brasil acelera e a sustentabilidade e o meio ambiente tornam-se cada vez mais apenas figuras de linguagem ou modismos. A Primavera já Silenciosa emudece por completo. Sem falar de desmatamento, o país progride no envenenamento de seu solo, seus lençóis freáticos e aquíferos e sua população.
Telma Teixeira. RHIOS Julho 2018
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